Lúcio Nunes – 21/07/2022


Palestra de Allan da Rosa na EXPO  ressaltou
o papel transformador da escrita e da oralidade

Escritor, arte-educador, mestre de capoeira e pesquisador, Allan da Rosa trouxe à EXPO Cidades Criativas Brasileiras, a convite do Sebrae, um pouco de sua trajetória como líder do Movimento de Literatura Periférica de São Paulo.

Em palestra realizada nesta quinta-feira (21/7), Allan contou como o projeto viabiliza cursos experimentais e autônomos em áreas vulneráveis da capital paulista e região metropolitana, como Americanópolis, Perus, Brasilândia e Taboão da Serra – explorando frestas para ampliar o trabalho de arte-educação independente. Uma missão que contempla ainda sua formação como historiador na Universidade de São Paulo, onde também se tornou Mestre e Doutor em Cultura e Educação.

“Começamos fazendo chamadas em terminais de ônibus e em redutos de movimentos artísticos independentes. E encontramos um viés para alimentar as buscas diárias e históricas de cada pessoa. Centenas delas passaram a atravessar a cidade para, por exemplo, passar dois meses em uma garagem estudando tecnologias ancestrais”, relatou, na abertura de sua palestra.

Em busca do que chama de ‘trança frutífera entre tema, didática, forma e lugar’, Allan compartilhou suas experiências com a EJA – Educação de Jovens e Adultos (modalidade de educação básica destinada a maiores de 15 anos que não tiveram acesso ou concluíram o Ensino Fundamental), abordou a importância da oralidade como uma usina de técnicas e questionou passagens da história brasileira em que a tecnologia foi utilizada de forma equivocada.

“Entre o fim do século 19 e o início do século 20, nosso projeto de Estado era a eugenia. Em nome da ordem e do progresso, a ciência e a tecnologia pareciam servir à extinção do misticismo, do simbólico, do não cartesiano”. Em contraponto, Allan ressaltou como a literatura sempre foi capaz de confundir, trazer emoções e questionamentos, especialmente quando consideramos a diversidade da arte da palavra pelo mundo.

Em outro momento, acrescentou: “A cultura letrada oral é considerada subalterna na escola. Mas uma das formas de se fazer poesia e abrir o imaginário é por meio de adivinhações. Aprender como seduzir apresentando artes ocultas. É uma forma de se expressar em inúmeros lugares das Américas e em países como Congo e Angola, de onde vieram a maior parte das populações africanas trazendo estéticas fascinantes, porém desconsideradas no Brasil”.

Com estas e outras fala importantes, além de citações a Rubens Berta, Paulo Leminski e tradições de diversos povos indígenas e africanos, a apresentação mostrou como o Movimento de Literatura Periférica tem se movido para romper esta tendência histórica. Sem desconsiderar gráficos que mostram, por exemplo, que mais de 3,2 milhões de brasileiros – em sua maioria negros e negras – não conseguiram voltar ao seus postos de trabalho no pós-pandemia, mas valorizando como a literatura pode acessar o que foi o cotidiano de cada um deles, de forma mais profunda.

“A literatura mobiliza nossas coragens, nossos medos, nossas estranhezas. O grande problema é que existe uma noção de universalidade que se alastrou com cruzes e espingardas, levando para calabouços, manicômios e cárceres quem não se adequasse. Mas a gente pode contestar tudo. E escrever um texto, lidar com uma tecnologia, testá-la, sempre vai nos render muitas histórias e sensações. Vamos cultivar a dúvida nessa época de tantas certezas”, concluiu.

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